Eleger um democrata ou um tirano? Por Frei Gilvander Moreira[1]
A história da humanidade demonstra que vem de longe o uso em vão do nome de Deus e o abuso da dimensão de fé das pessoas por políticos dominadores e opressores dos povos. No seu sentido original, todas as religiões buscam humanizar as pessoas religando-as com o mistério de amor e respeito que as envolve. Invocando Deus, com diferentes nomes, as religiões procuram nos religar com o Ser Supremo, com o/a próximo/a, com todos os seres vivos e com nosso eu mais profundo. Entretanto, ao longo da história, as religiões se tornaram instituições com doutrinas, dogmas e seus “sacerdotes”, funcionários que muitas vezes as degeneram usando-as para galgar poder econômico, político e posições privilegiadas de status na sociedade.
Quem tem poder religioso pode oprimir e
explorar muito mais do que quem tem poder econômico, pois pode controlar
consciências, comportamentos, atitudes e o mais profundo das pessoas de fé. Na
Bíblia, no livro de Juízes, nos capítulos 19 a 21, e na profecia de Oseias,
sacerdotes (chefes religiosos) promovem guerra fratricida estimulando a
violência entre irmãos e irmãs usando em vão o nome de Deus. A idolatria
religiosa oprime e explora a dignidade humana.
A Bíblia atesta repúdio veemente dos
profetas e das profetisas à idolatria, que é adorar e servir a outros deuses,
ídolos “construídos por mãos humanas” que exigem sacrifícios das pessoas
ludibriadas em rituais religiosos que viabilizam projetos de acumulação de
ofertas, dízimo etc., o que resulta em “sacos de dinheiro” para falsos
sacerdotes e pastores mercenários. Imbuídos/as de ira santa, os profetas e as
profetisas bíblicas bradam: “Os ídolos
deles são prata e ouro, obras de mãos humanas” (Cf. Sl 115,4; Lv 19,4; Dt
4,28; Is 40,19-20; Os 8,6; Hab 2,18-20; At 19,26; Ap 9,20 e muitas outras
passagens bíblicas).
A mais letal de todas as idolatrias é
tentar domesticar o Deus da vida, mistério de infinito amor, e usá-lo para
tentar criar um verniz de bondade e humanidade por opressores travestidos de
bons samaritanos. Diante destes, possuído por uma ira santa e profética, Jesus
Cristo “chutou o pau da barraca” e expulsou os mercadores do templo (Mt
21,12-13; Mc 11,15-19; Lc 19,45-49; Jo 2,13-25 ).
Ao longo da história, ditadores e tiranos
sempre usaram e abusaram da dimensão de fé das pessoas e invocaram o nome de
Deus em vão. Os imperadores do sanguinário, opressor e repressor Império Romano
se consideravam deuses e exigiam o culto ao imperador. Na época em que foi
escrito o livro do Apocalipse, nos anos 54 a 110, os imperadores Nero e
Domiciano impuseram brutal tribulação às primeiras comunidades cristãs e ao
povo escravizado. Esfolaram brutalmente o povo com pesadíssima carga tributária,
perseguição e repressão. Muitos líderes das comunidades foram presos,
torturados e mortos. Ao escrever o livro do Apocalipse, seu autor teve que usar
nome falso, João, para não ser torturado e morto. Muitas pessoas foram
martirizadas, como os apóstolos Tiago e Paulo. Também foi martirizado Antipas, “fiel
seguidor de Jesus Cristo”, membro da Comunidade cristã de Pérgamo (Ap 2,13).
Na invasão da África e das Américas por
europeus que exerciam poder opressor também a cruz, símbolo do cristianismo,
foi levada à frente da espada que vinha escondida na mão atrás do corpo do
projeto colonizador. Em nome de uma fé idólatra, negros e indígenas foram
criminalizados e demonizados como se não fossem humanos. Esta violência
religiosa pavimentou o caminho para o massacre e o genocídio de povos negros e
indígenas e a brutal escravidão imposta no Brasil há mais de 350 anos.
Com o slogan “Deus, Pátria e Família”, o
fascismo se espalhou na Europa com Benito Mussolini na Itália, Adolfo Hitler na
Alemanha e com o general Franco na Espanha, sendo estes eleitos pelo povo seduzido
e cegado por líderes religiosos e até pelo papa Pio XI, que se arrependeu
amargamente ao descobrir as atrocidades dos fascistas. O papa Pio XI percebeu
tarde que tinha chocado ovo de serpente. Com os nazifascistas europeus no poder, milhões de pessoas foram
assassinadas – mais de 6 milhões de
judeus, ciganos, camponeses, homossexuais etc., - em nome de “raça pura”,
pensamento único, uniformização cultural da sociedade a partir dos que estão no
poder tiranizando a maioria do povo e tecendo relações sociais escravocratas.
Imposta
ao povo brasileiro em 31 de março de 1964 a ditadura militar-civil-empresarial
também usou e abusou da dimensão de fé do povo. Usando os símbolos nacionais,
bandeira do Brasil, o verde amarelismo e o patriotismo xenófobo, houve marchas
“religiosas” idolátricas em defesa da “Família, Deus e Propriedade” em apoio à
ditadura militar que se implantava e que mentirosamente alegava ser um regime
que livraria o Brasil do comunismo, cortina de fumaça para um projeto de
dominação política e econômica que abriu as portas do Brasil para as empresas
transnacionais com desnacionalização da nossa economia.
Na
prática, os generais ditadores impuseram o terror com o AI-5[2]
fechando o Congresso Nacional, mudando a Constituição, cassando deputados e
senadores, exilando muitas lideranças – “cérebro do povo brasileiro” -, impondo
tortura e morte, aprofundando a brutal desigualdade social existente. Sob a
baioneta dos generais tiranos, a Reforma Agrária foi bloqueada com perseguição
brutal às mais de 1200 Ligas Camponesas existentes e a latifundiarização do
país foi incrementada. Os generais ditadores determinaram que empresários que
comprassem terras na Amazônia ou no Centro-oeste teriam isenção de 50% de
impostos.
Criado e
difundido por Paulo Freire, o Movimento de Educação de Base (MEB) foi extinto,
porque interessava à ditadura manter altíssimas taxas de analfabetismo no meio
do povo. Obras faraônicas, como a rodovia Transamazônica, foram feitas para
abrir caminho para a invasão da Amazônia e o endividamento do Brasil perante os
Estados Unidos e empresas transnacionais. A ditadura impediu a realização de
Reformas Sociais de base necessárias para construirmos Justiça Agrária, Social
e Urbana.
Agora, nas eleições de 2022, novamente
está acontecendo o uso e o abuso escancarado do nome de Deus e de versículos
bíblicos para tentar justificar um projeto de poder ditatorial e a implantação
de mais uma ditadura no Brasil. Isso é brutal idolatria. Será atitude suicida
autorizar pelo voto o início de mais uma ditadura no Brasil que, sob a tirania
de uma pessoa desumana, será sanguinária e precipitará o fim da humanidade.
Além de milhares de humanos mortos, será a devastação completa da
biodiversidade e da Amazônia, o que secará os rios aéreos causando a
desertificação das regiões Centro-oeste, Sudeste e Sul do Brasil.
O inominável antipresidente, em conluio
com falsos pastores e padres mercenários, segue abusando da dimensão religiosa das pessoas,
seduzindo e cegando muita gente. Há tantos sinais que demonstram que Bolsonaro
não é cristão e nem defensor da família. Como pode ser aceito como defensor da
família alguém com a história familiar que tem, que já agrediu e ofendeu tantas
mulheres, que tem ligações com milicianos, com inúmeros casos de “rachadinhas”
envolvendo funcionários fantasmas, que tem como ídolo o torturador Ustra, que
assinou 34 decretos flexibilizando o acesso a armas que só aumentam a
violência, que atrasou em seis meses a compra de vacinas, desdenhou da dor de
quem estava asfixiado pela Covid-19 e, assim, condenou à morte quase 700 mil
pessoas? Como pode alguém ser aceito como paladino da moralidade com mais de 17
casos de corrupção constatados[3]
e que coloca muita coisa suspeita sob sigilo de 100 anos? Como pode ser
considerado digno e competente para ser reeleito presidente do Brasil alguém
que desgovernou o Brasil nos últimos 4 anos impondo fome atroz a mais de 33
milhões de pessoas, proibindo fiscais do Governo Federal de fiscalizar o
desmatamento da Amazônia, em conluio com garimpeiros e invasores de terras dos
povos indígenas, não demarcando nem um centímetro de terra dos indígenas,
fustigando e ameaçando o Supremo Tribunal Federal para não julgar e demonstrar
a inconstitucionalidade da esdrúxula tese do Marco Temporal?
Lula não
é perfeito, mas é mil vezes melhor que o inominável antipresidente. Em 8 anos
como presidente do Brasil, ele demonstrou que tem compromisso com a democracia,
com políticas públicas que garantem a dignidade e o desenvolvimento do povo.
Compromete-se, agora, com o aumento anual e real do salário mínimo, com a
continuidade do Bolsa Família/Auxílio Brasil de R$600,00, com o resgate de
políticas públicas que atendam às reivindicações justas e legítimas dos Povos
Indígenas, Quilombolas e de todos os outros Povos e Comunidades Tradicionais.
Compromete-se com políticas que asseguram o combate ao racismo, à homofobia e
ao feminicídio; com investimento pesado no SUS[4]
e na educação pública, da creche ao pós-universidade; com a fiscalização e coibição
do desmatamento ilegal, com o apoio à agricultura famíliar na linha da
agroecologia; com a política externa cidadã que garanta a responsabilidade que
o Brasil tem no contexto internacional.
Enfim, aprendamos com a história do fascismo que nos diz que muitos ditadores e tiranos foram eleitos usando e abusando do nome de Deus e acenando de forma hipócrita para as pessoas religiosas. O Fascismo é ovo de serpente e não deve ser chocado. Para o bem do povo, do meio ambiente e das próximas gerações, justo e ético é votar no 2º turno dia 30 de outubro próximo (2022), em LULA para PRESIDENTE DO BRASIL, n. 13.
11/10/2022
Obs.: As
videorreportagens nos links, abaixo, versam sobre o assunto tratado acima.
1 – Uso abusivo da religião nas
eleições - Por frei Gilvander - 1º/10/2022
2 - Modelo de
sociedade escravocrata violenta sendo imposto pelo bolsonarismo? Por Pastor Ed
René Kivitz
3 - Dez mudanças que ocorrerão nas
igrejas caso Bolsonaro perca a reeleição para Presidente do Brasil
4 - Por que
Evangélicos, Católicos e pessoas de outras religiões devem votar em Lula no 2º
turno?
5 - Ato
Interreligioso em BH/MG em defesa da democracia, da vida, pela paz e contra
golpistas/opressores
6 - Carta
da Democracia e as Eleições no Brasil, com o advogado Antonio Carlos Kakay
7 - A
Democracia funciona quando existe respeito aos direitos humanos. Por frei
Gilvander - 12/4/2021
8 - Vote
pela democracia, pela justiça, paz e pela vida! Por frei Gilvander - 1ª Parte -
11/11/2020
9 - Luta
contra mineração no 27º Grito dos Excluídos, em Itabira, MG, no Palavra Ética
na TVC-BH
10 - 27º
Grito dos Excluídos, de Itabira, MG, no Palavra Ética da TVC-BH: Fora,
Bolsonaro! 07/09/2021
11 -
Fernando Francisco de Gois, outro Cristo/Servo de Deus no meio dos excluídos,
em São Félix/MT agora
12 - 5ª
Romaria das Águas e da Terra da bacia d rio Doce, Conceição do Mato Dentro/MG.
Com Frei Gilvander
13 -
Milhares no 28º Grito dos Excluídos em BH/MG: "Fora, Bolsonaro! Lula, Lá!
Resgate de direitos, já!"
[1] Padre da Ordem
dos Carmelitas; doutor em Educação pela Faculdade de Educação da Universidade
Federal de Minas Gerais (FAE/UFMG); licenciado e bacharel em Filosofia pela
Universidade Federal do Paraná (UFPR); bacharel em Teologia pelo Instituto
Teológico São Paulo (ITESP; mestre em Exegese Bíblica pelo Pontifício Instituto
Bíblico, em Roma, Itália; agente e assessor da Comissão Pastoral da Terra/MG
(CPT), assessor do Centro Ecumênico de Estudos Bíblicos (CEBI) e das Ocupações
Urbanas; prof. de Teologia bíblica no Serviço de Animação Bíblica (SAB), em
Belo Horizonte, MG; colunista de vários sites; e-mail: gilvanderlm@gmail.com – www.gilvander.org.br – www.freigilvander.blogspot.com.br
– www.twitter.com/gilvanderluis – Facebook:
Gilvander Moreira III
[2] Editado pelo general ditador
Artur da Costa e Silva, dia 13 de dezembro de 1968, o Ato Institucional n. 5
foi um dos mais terríveis 17 Atos Institucionais decretados pelos generais da
ditadura de 1964 a 1985. Impôs os “anos de chumbo”, fechou o Congresso
Nacional, impôs uma nova Constituição e um regime tirânico sanguinário.
[3] 17 casos de corrupção de
Bolsonaro, seu clã e governo: 1) Rachadinha é uma “prática comum”, diz
Bolsonaro; 2) Funcionários fantasmas dos Bolsonaros receberam 29 milhões de
reais em salários; 3) A ligação do clã Bolsonaro com paramilitares e milicianos
se estreitou com a eleição de Flávio Bolsonaro; 4) Queiroz diz porque depositou
89 mil reais na conta de Michelle Bolsonaro; 5) Família Bolsonaro atuou para
esconder e proteger Fabrício Queiroz; 6) Ricardo Salles é investigado por esquema
de exportação ilegal de madeira; 7) “Governo Bolsonaro pediu propina de 1 dólar
por dose”, diz vendedor de vacina; 8) Ex-ministro Milton Ribeiro foi preso em
Operação da Polícia Federal por crimes na condução do Ministério da Educação;
9) Procuradoria no TCU vê indício de crime em compras de trator com verba para
família pobre; 10) Diretor geral da Polícia Federal troca comando de setor que
investiga Bolsonaro; 11) Chefe da SECOM recebe dinheiro de emissoras e agências
contratadas pelo governo Bolsonaro; 12) Licitação do Governo prevê pagar R$732
milhões a mais por ônibus escolares; 13) Dinheiro público banca centenas de
caminhões de lixo com preços inflados; 14) Bolsonaro tenta “lavar as mãos”
sobre Orçamento Secreto, mas histórico mostra atuação conjunta do governo com o
Congresso; 15) Vacina, cartão, viagens, caso Genivaldo: Lista de sigilos do
governo cresce; 16) Flávio Bolsonaro compra mansão de R$ 5,97 milhões em bairro
nobre de Brasília; 17) Metade do patrimônio do clã Bolsonaro foi comprada em
dinheiro vivo (51 imóveis).
[4] Sistema Único de Saúde.
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